O tamanho dos afetos


Nunca fui uma rapariga magra. Nem mesmo em criança. Se alguma vez pesei 50 kg deve ter sido algures na pré-adolescência o que significa que não era um bom peso.
Poucos gozaram comigo por ser gordinha, porque eu era a primeira a fazê-lo. “Qualquer dia ponho manteiga nas ancas para deslizar melhor quando passar nas portas”, dizia eu. E era gargalhada geral. Assim, defendia-me de qualquer comentário mais agreste e fazia-me sentir aceite. Porém, não dei conta que esta defesa fez crescer em mim, ao longo dos anos, um muro com grafiti gigantesco a dizer: Nasci gorda, hei-de morrer gorda.
Mas ninguém gosta de ser gordo. 
Ninguém pode dizer que é feliz com mais 20 kg.  Por muito que queiramos esquecer, esses quilos pesam-nos a mais, no corpo e na alma. Nas escadas que nos tiram a respiração, nas brincadeiras que não conseguimos terminar com os filhos, nos valores descontrolados das análises clínicas. Depois...nas roupas que não conseguimos apertar, no espelho que se torna o nosso pior inimigo e num sentimento obscuro que nos queima a autoestima.
Em alturas de maior pressão, comer dá-me um momento fugaz de satisfação. E em períodos de pior estado mental (não é que o meu estado mental alguma vez tenha sido bom...), chego a acreditar que comer é a minha única fonte de felicidade. Mas depois... depois vem a ressaca do excesso de chocolates, doces e pratadas de comida, e com ela vêm as dores agudas de enfrentar o meu reflexo no espelho. Nunca tive uma ressaca a sério, mas julgo que o que acabei de descrever deve ser bem mais doloroso que uma boa dose de vinhaça. Essa pelo menos desparece com café forte, guronsan e aspirina.
Iniciei, pela 527ª vez, mais uma dieta e algumas medidas para controlar o peso (maneira simpática de dizer que estou a passar fome e a fazer sofrer as minhas articulações) e não tem sido tão mau como isso. Comecei há dois dias e só fiz 5 asneiras :) Não sou boa a matemática, mas parece-me uma boa média, não?
Todos os dias vão ser uma batalha e estou a aprender a concentrar-me em mim (coisa que não é inata para quem tem filhos pequenos). Como disse a minha melhor amiga: “concentra-te em TI: em gostares de TI. Foca-te”. 
(Sim, ela disse “foca-te” e não “macaca-te” ou “leoa-te”...piada seca esta hein? Efeitos da falta de açúcar, é o que é!)
Ainda que cometa alguma “infração”, quero acreditar que com persistência vou derrubar o muro que criei em mim. Que vou fazer algo por mim e não para os outros.
Porque os outros - a família, os amigos, os colegas - sempre nos conheceram assim. Os que gostam realmente de nós dizem-nos: “És linda, mas tens de gostar de ti tanto quanto nós gostamos!”
E por isso, resta-me aprender com o meu filho mais novo - cuja dicção não é (para já) o seu forte – que ao ver uma mãe gordinha na televisão me disse: “ Aquela senôla (senhora em português corrente) é uma mãe gôda”. “A mamã também é 'gôda', disse eu. E ele respondeu-me com um abraço: “Não mamã...tu és maguinha!”.
Porque para os afetos não há tamanhos. 

Comentários

  1. Na vida caminhamos juntos, sempre juntos! Por isso esta batalha também é minha e estou preparado para irmos à luta. Custe o que custar nós vamos conseguir e tu vais alcançar o objetivo a que te propões.
    És linda, eu amo-te e tens de gostar de ti tanto quanto eu gosto!

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